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Um guardião da Cultura Axiluanda, Horácio Dá Mesquita

Horácio Dá Mesquita é uma cacimba da cultura axiluanda a qual a Plataforma História Social de Angola (HSA) foi colher factos. Cruzamos na festividade do 11 de Novembro de 2023, na diáspora lisbonense na Fábrica do Braço de Prata. Chegou discretamente e quando nos foi apresentado, percebemos que o “mais velho” da Rebita é um exímio concertinista e pianista há mais de cinquenta anos. Identificamos um amigo comum e apresentamos o propósito da HSA, prontamente aceitou prestar depoimento.

Os motores de busca confirmam a nossa inquietação, é ínfima a informação sobre este artista, cuja multidisciplinaridade faz dele um dos expoentes da cultura angolana nos séculos XX e XXI. Contrariamente, a maioria dos depoentes, não foi referenciado por outro. Era anónimo até termos “esbarrado” com esta humilde celebridade nacional.

O reconhecimento tardio chegou em 2017, ano de atribuição do 1º prémio nacional, os três prémios nacionais da cultura não o envaidece, pelo contrário regressa nostalgicamente a sua meninice e a outras idades numa tarde de uma chuva de bruxos, sentados no salão de dança da Rebita e ao som das suas concertinas, de forma didática descreve a Luanda colonial e a pós-colonial. Foi tocando à medida que descrevia factos sociais do cancioneiro nacional e da Massemba dos ilhéus de Luanda. Inevitavelmente, o lugar, a presença de amigos, de colegas e alguns comentários dos entrevistadores levaram-no a reviver o drama da guerra durante a qual o antigo soldado perdeu amigos de infância, colegas da escola 147, do escotismo, das matinês no Cine São Domingos…

Provavelmente, por ser um “depoimento” o Mestre Dá Mesquita passou uma Bassula de Kissoco[1] e esquivou-se de outras memórias, talvez não prevendo a ignorância dos entrevistadores sobre a sua multidisciplinaridade, o que do ponto de vista metodológico é ideal para se evitar a indução do entrevistado. Pois, foi no decorrer, da edição da transcrição do audiovisual que nos apercebemos da sua genialidade: música, artes plásticas, olaria, muito jovem eleito o primeiro grafiteiro de Angola, o senhor da filatelia, notafilia, numismática angolana, entre outras. As suas obras de arte se encontram no Museu da Moeda em Luanda e no Museu Nacional de Antropologia. Também é escritor e ilustrador de livros.

Falando da importância da preservação e resgate da história social descreve as virtudes da época citando dois exímios músicos, os irmãos Malé Malembá e Fontinhas, referências na educação, moralidade e musicalidade nacional.

Recomenda a juventude estar atenta ao decadente racismo estrutural, com características próprias em Angola e na diáspora, este residente em musseques desde o seu nascimento detalha o crescimento desta “enfermidade” consoante nos aproximamos do centro da cidade e desvanece conforme entramos nos nossos   musseques axiluandas.

A aula não será a última porque aceitamos o convite para capturar os ritmos e os sons dos Novatos da Ilha, com a promessa de partilharmos este legado da riqueza cultural axiluanda na primeira pessoa.

Contexto

Alugamos este espaço para o rentabilizar, nós ensaiamos as quartas feiras, podem vir a quarta feira e fazer um audiovisual só da Rebita[2], era a sociedade angolana dos anos 1940-1960. Na época não havia conjuntos, havia turmas, não havia instrumentos musicais, ninguém tinha violas, era a época das concertinas. Vendiam-nas nas mercearias, ficavam em uma caixa de sapatos, antes ficavam em caixas de papelão, arrumadas ao lado das bolas de catchu, das câmaras de ar e dos brinquedos, naquelas vitrinas onde ficavam as prateleiras das sandes de chouriço, do bolo rocha, das sandes de peixe frito e de rabo de bode, os pirolitos… “A concertina já está gravada com o som da chuva, esta concertina é histórica, é das primeiras que marcaram os anos 40”.

Introdução

Chamo-me Horácio Dá Mesquita, nasci em Benguela, em 1953, fui baptizado na Igreja do Nossa Senhora do Pópulo, vim com cinco anos para Luanda e fui criado em Luanda, hoje tenho 70 anos, faço 71 no dia 26 de Dezembro, toda a minha educação foi aqui, “inaugurei” (aluno do 1º Ano Lectivo) a Escola 147, no Marçal, foi uma escola que me marcou muito e a muitos outros.

Angola, 1960

Vivi sempre em Luanda, toda a minha vida foi na periferia, mas também na cidade nos vários grupos sociais que havia. Portanto, eu neste país em que estamos, eu assisti as várias metamorfoses. A fase anterior a 1960 é uma fase em que nem se falava em guerras, muito boa em que quando era pequeno, brincávamos com papagaios, fazíamos papagaios, andávamos por todo lado. Jogamos muito futebol nos intervalos das aulas. Depois de 1961 foi uma fase turbulenta para nós, para mim com seis anos, não entendia bem o que se passava e a vida continuou.

A vida continuou, Angola deu um salto muito grande em termos económicos com a (as mudanças) administração portuguesa, houve um desenvolvimento notório, mesmo nós miúdos notamos, estava estagnada até ali. Nem havia conjuntos musicais até 1960-61 e não havia essa actividade turística que depois houve. Havia muitas boates, havia muito emprego para os músicos, havia muita Rebita. A Rebita, naquele tempo era o Abel Mona Dikota e outros, havia mais de onze grupos de Rebita, hoje só temos este onde eu estou como presidente, por incrível que pareça!

Tocavam com esta concertina (apontando), praticamente não havia violões, pouca gente tinha um violão, sabia tocar violão, sabia tocar a concertina. Isso é o som que se ouvia naquele tempo (toca a primeira concertina), é desconhecido; hoje temos essa concertina que é a única que se toca hoje. Mas, por incrível que pareça, o que sobreviveu de toda aquela história social está explanada no livro de Óscar Ribas, é esse grupo em que eu sou presidente, os Novatos da Ilha, não existe mais nenhum. A Rebita foi elevada a património material nacional e estamos aqui neste recinto a fazer isso, nesse recinto histórico, é o que resta. Os resquícios que restam daquele tempo airoso, hoje temos um desfasamento.

Ensino e emprego

Voltando àquela data, depois de 1961 Angola começou a expandir-se em termos de prosperidade, havia emprego para todos, havia falta de trabalhadores para o novo desenvolvimento que Angola tinha, começou-se a falar do vadio. Portanto, naqueles que não trabalhavam porque não queriam, naquele tempo só não trabalhava quem não queria. Havia a polícia, a PSP (polícia) e os cipaios sabiam o nome de cada um de nós, sabiam o nome de quem era vadio e de quem não era, conheciam os nossos pais, todos se conheciam, daqueles que queriam estudar e dos que não queriam.

Não havia a escolaridade obrigatória, havia escolaridade obrigatória por consciência porque havia escola para todos. Essa coisa de dizer que no tempo colonial não havia escola, é mentira, e nós hoje vemos porque há documentação “não vale a pena brincar com o vento ou tentar travar o vento com os dedos”. Porque hoje nós vemos nos livros o Liceu Salvador Correia cheio de brancos e pretos, aliás há dirigentes que estudaram lá e em outros liceus, estudaram nas missões, seja em Malange, seja no Bailundo, havia escola para todos.  Não havia discriminação racial e nem social, havia realmente as várias classes sociais, mas todos conviviam.

Havia um padrão social, mas todas as famílias tinham um padrão de educação, independente da sua raça, todos tinham aquele padrão de educação, todos, todos. E quando os filhos, o rapaz fazia alguma coisa, fazia um desmando próprio da rebeldia da sua juventude, vinham e chamavam os pais, vinham ter com os pais, era isso que se fazia naquele tempo! E tínhamos esse padrão.

Cultura Axiluanda[3]

Houve um boom em termos culturais, começou a haver turismo, os barcos começaram a aportar aqui, muitos paquetes e cruzeiros aportaram aqui, conhecemos muita gente.  A cidade de Luanda conservava os seus edifícios históricos, o seu patrimônio histórico, hoje “não temos nada”. Era tudo conservado, lá em cima o palácio, a rua do Casuno, o Baleizão[4], tudo estava conservado, era uma cidade bonita, onde havia a parte moderna e a parte antiga. Portanto, havia um ambiente noturno muito activo por causa dos Cabreza Dias, dia e noite, com duzentos mil habitantes tínhamos onze grupos de Rebita, só a Rebita para não falarmos em outros.

A Ilha era conservada, a cultura dos Axiluandas, axiluandas no plural, axiluanda no singular. Todos andavam vestidos com os panos, com os kikongos, as bessanganas. 

Depois, havia aquela parte romântica “a resistência” em que ouvíamos falar que o pessoal daqui apoiava essa luta descaradamente como a Dra. Medina, que defendeu o nacionalismo, isso são factos históricos. Depois, diziam “os terroristas”, falavam da Dra. Medina que era loira e ela defendeu até a última os nacionalistas, ali em cima onde está hoje o Ministério da Justiça, foi naquele local. 

Houve uma actividade muito grande dos conjuntos, as farras, o semba. O que foi o embrião do Semba? Naquele tempo não se falava em Semba, Semba era a Rebita, a Rebita é que era a Semba, porque dava a Semba, ou seja a Massemba[5], porque era a duplicado da semba, da umbigada. Portanto, eu tenho o livro do Lamartine, já mostrei aqui ao pessoal, um livro interessante, ainda não terminei, onde ele especifica também isso e há outros que sustentam essa versão, “a Massemba são as várias umbigadas que a Rebita dá” que vamos ter a oportunidade depois de gravar aqui para poderem  entender isso que eu estou a dizer, ensaiamos  aqui todas as quartas feiras.

25 de Abril

Veio o 25 de Abril, ficamos surpreendidos, porquê? Porque ficamos todos entusiasmados na expectativa que com aquela coisa do 25 de Abril… começou a haver aqui convulsões, em Portugal penso que nem por isso. Depois de ter conhecido Portugal, eu acho que em Portugal foi o fascismo, aqui nós falamos do colonialismo. Mas, eu não falo no colonialismo porque depois disso tudo, das lutas internas que nós tivemos, em 2024 cheguei a conclusão de que afinal não havia “colonialismo” comparado com o que se faz hoje: a depilação completa do nosso erário público, os empréstimos que vieram com base no petróleo, não houve desenvolvimento nenhum, uns estão riquíssimos, o dinheiro está todo lá fora e isso está aos olhos de toda a gente, eu não estou a dizer nada de novo. Portanto, naquele tempo, voltando outra vez “eu estou a datar para se comparar”, naquela altura os portugueses investiram tudo aqui, eles não queriam ouvir falar de Portugal, do sítio onde nasceram, nem pensar em voltar, eles investiram tudo aqui, daí o desenvolvimento e o boom que Angola teve.

A infância e a juventude

Fui criado no Sambizanga e no Marçal, naquelas escolas onde todos tivemos, onde brincávamos com os papagaios e jogávamos futebol, nós não tínhamos muito mais e depois era procurarmos ir ao cinema, tínhamos de juntar os trocados para irmos ao cinema  aos  fins de semana no São Domingos. Naquela altura, entre os meus sete e oito anos vivíamos no Marçal, os meus tios e a minha avó pediam-me sempre para eu ir comprar o vinho, ia comprar à mercearia, nas mercearias os senhores conhecem-nos. Comprávamos tudo em pacotes, comprávamos pacotes com o vale e ao fim do mês pagávamos e quando ia comprar a dinheiro procurava sempre ficar com um trocado para ao fim de semana poder ir à matinée, ver os filmes de acção que nós gostávamos no São Domingos ou no Cinema Colonial em São Paulo, onde houvesse os filmes de Acção. Brincávamos no musseque, reconstituíamos os filmes, principalmente os filmes de cowboy, os artistas, os bandidos e tínhamos também conjuntos de lata. Era a nossa vivência!

A alimentação

É preciso notar que naquela altura as escolas tinham a merenda que era o pão com marmelada e o copo de leite com chocolate, com um bocadinho de chocolate ou não, era a merenda! Depois, jogamos o nosso futebol naqueles quinze minutos de intervalo, jogávamos e depois voltávamos, comprávamos os nossos pirulitos, os vendedores  ficavam com aquele suporte dos pirulitos.

A alimentação era uma alimentação mais saudável porque não havia esses transgênicos, não havia o plástico naquele tempo, o plástico ainda não estava descoberto. Primeiro, apareceu o backlit, até me lembro dos meus brinquedos, eram jeeps willy de ou em plástico e partiam-se todos porque o backlit era muito quebrável, não era dobrável, mais tarde apareceu o plástico (conforme conhecemos hoje), foi na época do 25 de Abril que se desenvolveu o plástico.

A comida era a comida que nós comemos hoje, não alterou, principalmente a tradicional, os pratos eram os mesmos. Agora, há influências do sushi e de outras gastronomias, mas nós em Angola mantemos a base daquele tempo, não houve alteração, é sempre o feijão de óleo de palma, a feijoada, o cozido à portuguesa, mantém-se. Houve uma perda de determinados pratos e hábitos isso houve e na questão cultural também desapareceu muita coisa.

Factos marcantes do tempo de estudante  

Nós estávamos na descoberta da vida, na nossa formação como pessoas, como homens como mulheres. Tínhamos as nossas namoradas, as namoradas íamos esperá-las, as namoradas nunca eram da mesma escola, eram da outra escola.  Já na fase da juventude íamos esperar no liceu Guiomar de Lencastre “fazer as nossas esperas”, acompanhá-las. Fazer aquele namoro, acompanhar até a porta e depois não podíamos nos aproximar muito de casa, porque o pai da miúda não podia nos ver ou a família, aquelas coisas todas, o “namoro de muro e de janela”, isto hoje não existe, são factos que nos marcaram.

Havia muito mais valores familiares e normas de conduta rigorosas que eram impostas como padrão a todas as famílias independentemente da sua raça, seja do musseque ou não, em todo o lado o padrão era o mesmo, tanto é que estudávamos na mesma escola. Eu tinha colegas de extratos sociais mais elevados, ricos que estudavam na mesma escola que eu, na escola pública, na escola de estado, não iam para os colégios e portanto o padrão era o mesmo, havia e convivemos todos na mesma.

Recrutamento militar, 1974

É claro que chegou o 25 de Abril, abriu muitas expectativas, aqui começou a haver muita turbulência, o pessoal entusiasmado com aquela movimentação dos movimentos de libertação, a entrada deles em Luanda, começou a haver excessos, para nós foi um choque.

Eu fui para as Forças Armadas, nós não tínhamos outra opção, tínhamos de combater. Ou íamos embora, ou ficávamos aqui sujeitos a ir para as frentes de combate, foi o que me aconteceu. Mas, eu aproveitei essa fase para torná-la romântica, ter amigos e estarmos em momentos muito importantes da nossa vida, da nossa independência, nas frentes de combate. Hoje, escrevo histórias e tenho documentação, fotografias inéditas, hoje tenho marcos da nossa história que não consigo esquecer, embora queira me esquecer não consigo. Estive em muitas frentes, muitos amigos, vi os meus melhores amigos morrerem e, portanto, foi uma fase muito turbulenta.

A música e artes plásticas

Vou contar a minha história das profissões, eu tive um trambolhão muito grande na minha história da profissão. Estou a fazer essa cronologia, dez anos depois e dez anos atrás, volto atrás para contar o que se passou, não estou a mentir, ainda falta muita história do passado, da minha família e dos meus amigos. Para começar alguns já morreram, mas isso não podemos evitar, a guerra apanhou toda a juventude. Nessa altura, perdi bastantes amigos, eram amigos do período da administração colonial  e depois fomos todos juntos, o Chico, o Dom Quico que já morreu…, muitos morreram em combate ao meu lado, foram muitos combates, eu perdi a conta, nas mais diversas situações e nos  vários diversos locais, não me vou alongar mais.

Vou regressar ao período de escola, eu juntava o meu dinheiro e ia ver os filmes, mas íamos em conjunto e depois brincávamos, evoluímos para as nossas namoradas, as nossas esperas, já estávamos mais crescidos, já tínhamos apetência para as miúdas.

Como eu toquei sempre órgão, aprendi na Igreja São Domingos na minha actividade de escoteiro, comecei a profissão de organista. Começou a haver o boom dos conjuntos, os conjuntos começaram a aparecer e também os estabelecimentos de venda de instrumentos, a Casa Paris, a Aliança Comercial, a Fada do Lar (no Kinaxixi), a Casa Vox, a Tesco, a Inacor, a IREL, começou a haver muitos conjuntos. Quem é que financiava e pagava as letras desses conjuntos? Eram os comerciantes portugueses, eram os fiadores, eram eles que subsidiaram também o nosso Carnaval, o nosso Carnaval, o carnaval de rua.

O carnaval de rua nunca mais existiu, o carnaval de rua existiu no tempo da administração portuguesa, aí sim, andavam pela rua, grupos, depois também se provocava “atirava-se bocados de sacos de fubá, ovos…”, havia máscaras, mascarados, muitos mascarados, batucada de rua, havia, era o que havia mais era o carnaval de rua[6].

Quando veio a guerra e com a independência acabou “todo” o nosso tecido social foi uma deflagração, a movimentação dos povos, a falta de comida, todos nós sabemos! Começou a faltar pão, aqueles cartões de abastecimento que havia, até para os pensos higiénicos as senhoras viam-se aflitas, era algo horroroso que se passou, era uma coisa dolorosa o que se passou, enfim guerra é guerra!

Mas naquele período, vivemos aquele boom, eu vivia com os meus tios e com a minha avó, eram pessoas que nunca mais falaram de Portugal, do sítio deles, nunca mais quiseram saber, a terra deles era aqui onde eles investiram tudo, o investimento era aqui. Naqueles tempos, Angola era o segundo maior produtor de café do mundo, o segundo ou terceiro de sisal, havia tudo, eles diziam sempre “Angola é dos maiores países”. Chamar colonos àqueles indivíduos que estavam aqui não é razoável.

Eu vivia da música, tocava nas boates, toquei na Tamar, era pianista, ganhava muito bem naquele tempo e os músicos nas boates ganhavam muito bem, a nível de um gerente ou director de um banco. Os que tocavam nos conjuntos ao fim de semana também já ganhavam bem, já tinham a sua banda, as suas roupas e as suas namoradas, mas os que tocavam nas boates ganhavam mesmo bem, eram profissionais a sério. Eu ainda não tinha idade, tinha dezassete anos e já tocava e aqui na Tamar, os donos, o Cardona e o Ari Lopes diziam que quando viesse a inspecção eu dizer que tinha dezanove anos porque a inspecção geral de espectáculos fazia o controle, eu tocava no Maximo e no Flamingo, foi tudo partido, o único onde eu toquei que existe foi o Dom Quixote, o Veleiro foi alterado, era também uma boate, portanto tínhamos uma vida noturna musical, eu vivia só da música. 

E apesar de eu ser desenhador e pintor jurava a toda a gente que nunca ia vender um quadro na minha vida, eu ia viver sempre da música. Ironia do destino, após a independência fui combater e no regresso a Luanda a música acabou. O que eu fiz realmente foi pintura e desenho. Propaganda para o partido, moderna, aqueles painéis gigantes, aqueles painéis da Praça 1º de Maio, a propaganda socialista, marxista-leninista e comecei a sobreviver daquilo porque depois fui tirado do exército por motivo de doença e fiquei no DEP, a trabalhar no Partido. Foi um trambolhão enorme, nunca mais ganhei um centavo com a música até hoje, toquei com o Kiezos, mas foi diversão, mesmo aqui na Rebita “está aqui o Comandante a ouvir”, não ganho nada, nunca ganhei nada, estou aqui, sou o presidente, antes pelo contrário, eu entrego-me, tiro o pão das minhas filhas para a Rebita.

Grafite, cerâmica e desenho, 70-80

Nesta fase, em que eu estive a trabalhar no Partido foi muito interessante, portanto o Altino diz que eu fui o primeiro grafiteiro, eu pintava com pistola naquele tempo 1979-80, pintava painéis, aplicava qualquer polimento. No entanto, eu sou asmático, fiquei muito doente e tive de parar, mas tinha sempre o núcleo de amigos, nós conservamos o núcleo de amigos das fases anteriores da vida em Angola e em Luanda.

Em 1982-83 vou pela primeira vez a Portugal, vou ver a minha mãe, não conhecia a minha mãe e a família que não conhecia, apanhei um choque. Cheguei na altura do verão, conheci a família e fui até ao Algarve. Estive uma temporada, encontrei amigos, o Beto Sassá e aquele pessoal todo daquele tempo da música, mas viver da música nunca mais vivi, foi sempre do desenho.

Depois, comecei a estudar cerâmica, as termodinâmicas, a construção de máquinas e é o que faço atualmente, eu hoje monto fábricas e equipamentos e ponho-os a funcionar, construo máquinas, procuro não importar nada. A minha filha mais velha está no 2º ano de engenharia mecânica, está a seguir os meus passos.

Hoje, continuo aqui a tentar fazer o que posso pelo nosso país, a tentar sobreviver, mas vivo essencialmente neste momento do desenho. A música faço por amor, não ganho nada, nunca ganhei, o dinheiro ganho com os Kiezos, eu deixei tudo com os Kiezos, sempre me recusei receber e aqui na Rebita procedo da mesma forma, ajudo a Rebita dentro do que eu posso.

Eu sou o Presidente Cessante, não quero continuar, não me candidato, eu vou pelos limites toleráveis pela ordem mundial, dois anos chega, tenho quinze anos na direcção da Rebita, muitos como vice-presidente e estes últimos como Presidente. Vou passar o posto para outros mais jovens.

Tive uma passagem muito interessante pelo Banco Nacional de Angola e pelos Correios de Angola, tenho duzentos selos desenhados, duzentos selos desenhados é muita coisa, talvez seja dos que mais desenhou selos. Passei pela ANGOLA TELECOM, fiz as três primeiras séries de cartões de telecard, fiz uma série de cartões para a UNITEL e até hoje trabalham comigo. O BNA foi muito marcante, eu nem vou dizer o que fiz no BNA, acho que até as pessoas me confundem com o BNA e mesmo entre o pessoal do BNA os Governadores têm muita consideração por mim, todos que passaram e não há motivos para serem diferentes, eu sempre fui uma pessoa muito dedicada, com muito amor ao próximo, ajudar o próximo.

Eu nesse momento, ajudo muito o próximo, de tal maneira há cerca de cinco meses (está aqui o pessoal da Rebita) às sete horas da noite recebi um comunicado do meu banco BCA a dizer “atenção o senhor já gastou três milhões de kwanzas, consulte o seu banco”, estão aqui as testemunhas (referindo-se a Beto Sassá, ao Comandante da Rebita e a Napoleão), três milhões tirados da minha família para ajudar as pessoas.

Portanto, eu conservo os valores e acho que vou morrer assim, não vou mudar e espero que as gerações seguintes, façam o mesmo que eu faço, tenham amor, conservem os amigos e não deixem de atender o  telefone como muitos fazem agora “sobem na vida e depois nem nos atendem os telefonemas”, parece que não nos conhecem, pessoas más, evitem ser isso. Procurem principalmente a quem tem fome, a quem está a precisar de um medicamento, é isso que eu penso, é isso que eu peço às pessoas.

Qual a importância da preservação e do resgate da memória oral dos angolanos sabendo que estamos numa época em que muitos já morreram?

Isso é um pau de dois bicos, que memória oral se os velhos já morreram todos?

  • quem nos vai contar a história da Rebita, você e essas pessoas que estão aqui? Por exemplo, conheceu o Beto Sassá em miúdos quando era escoteiro e estudavam na escola São Domingos?
  • ele era miúdo, a questão é a seguinte: aos catorze quinze anos nós temos outra morfologia, ainda somos miúdos e em dois anos damos um salto tremendo.

(questão colocada outra vez)

Nós hoje temos dificuldade e um dos grandes exemplos foi quando faleceu o Fontinhas, fiquei muito sentido e preocupado com o falecimento do Euclides Fontes Pereira[7], muito meu amigo e do irmão do Malé Malamba, também muito meu amigo, filhos do Manuel Mona Dikota. Quando eles morreram é que eu me apercebi que os entrevistavam por coisas banais, “sobre a revolução e o colono” e não passava disso! Não lhes perguntavam o mais importante, sobre qual foi a vida social deles, sobre o desenvolvimento, sobre o desenvolvimento da música. Inclusive arquivos fonográficos em fita do Fontinhas desapareceram e quando falo dele falo também de outros, mas esses eram sérios, há outros que não são tão sérios.

Esses outros, mesmo com 80 e 90 anos, vão a rádio dizer mentiras, induzirem as novas gerações ao ódio, ao racismo mesmo gratuitamente, sem sustentação e torna-se muito perigoso. Hoje, inibe o nosso desenvolvimento e inibe o turismo de se efetivar, não pode um branco andar na rua sem ser incomodado, é difícil!

Porque não se fez a recolha devida, séria, de início, dessas personalidades e de outras que efectivamente dissessem a razão, de como as coisas aconteceram.  Mas, o Fontinhas era e o Malé Malamba, eram reais. Portanto, eram pessoas que condenavam a perda e a falta de valores que hoje temos, a agressividade, a falta de respeito pela vida humana, o desprezo, o amor pelo próprio povo, pelas próprias pessoas, pela própria cultura, e eles morreram nessa angústia. Portanto, pessoas como eles e muitos outros faleceram e hoje andamos a vasculhar as cinzas e nas cinzas não encontramos nada, são só cinzas. Porque, quando se estava com eles as perguntas eram sempre a volta “…e o colono, e o branco, e isso e aquilo”, e hoje não se aproveita nada, o que importava era falar mal do branco e hoje falar mal do branco: o branco é racista, é isso, é aquilo, mas nós não! 

O racismo estrutural pós colonial

E os factos voltando à cronologia, hoje no momento actual o que é que nós vemos? Então, porque é que nós estamos à porta dos consulados, do consulado português, da Embaixada América, estão apinhados de gente para ir e a pedir a nacionalidade portuguesa outra vez? Então, queremos ser colonos, mas colonos como aqueles até merecia a pena, agora como estes de agora que não nos deixam nada, nem a história, adulteraram a história, o passado, o que é que resta de oralidade nesse momento, quase ninguém, da história do passado? Quase ninguém, o que resta agora são pessoas pouco sérias e isso está comprovado pelas pessoas que aparecem na rádio.

Hoje, na rádio, só nos induzem ao ódio, ao ódio racial e eu vejo isso e comprovo isso porque até as crianças…, porquê que se os brancos estiveram cá quinhentos anos, como é que hoje o negro hoje trata o branco como um extraterrestre? As crianças parecem que nunca viram um branco. As crianças já deviam ser educadas a tratar os outros por igual.  Eu por exemplo ando na rua neste momento e toda a gente, crianças, vem atrás de mim “oh boss”, pedirem, mas são capazes de verem  um V8 com negros encasacados que são os  meus patrões, são os que me pagam, mas são incapazes de pedir,  fogem deles, mas  vem ter comigo, insistem, eu a andar a pé, cansado, esfarrapado, pedirem dinheiro. Há dias eu perguntei a um amigo que é uma pessoa muito séria “porque é que me perseguem, eu não me posso sentar em uma esplanada, veem os outros e vem ter comigo, com o único branco”, ele disse-me assim “cota para eles o branco é humano”, portanto está tudo dito. Não me acontece nada nos musseques, eu morei muito tempo em musseques e há medida em que desço para a cidade é um horror.

É preciso abordar o racismo sem tabus, o racismo é mútuo porque ninguém nasce racista, em Angola apenas se fala do racismo europeu?

Nessa última fase, eu ganhei o prêmio nacional de cultura e de artes em 2017, no período de transição do Presidente José Eduardo dos Santos para o Presidente João Lourenço, quem assinou o meu diploma foi o Presidente João Lourenço. Ganhei não pela carreira, mas pelo mérito, também ganhei pela Rebita e pela Luanda Cartoon, tenho três prêmios nacionais de Cultura, dois em equipa e um individual.  E sempre vivi nos musseques, não só no período colonial como falei atrás situando cronologicamente, mas também agora neste período Pós-Covid. Portanto, para onde é que eu fui, para o Rangel, já no município do Cazenga e recusava-me a andar de carro e vinha sempre a pé, tenho amigos aqui e estão a confirmar para quem não está a ver (referindo-se aos presentes  mencionados anteriormente) e venho sempre a pé e volto a pé, vinha sempre a pé, dia e noite, as vezes tinha o Beto ao meu lado e  oferecia-me boleia, dizia-me “ épa, eu vou  te levar”, ele levava-me, deixava-me cerca de cinquenta metros antes da rotunda  ali no Rangel e depois ia aquele bocadinho a pé, não me acontecia nada, nunca ouvi falar   nem “branco” e nem nada, nem a incomodarem-me, nunca! Depois, fui para um dos sítios mais pobres que existe no mundo que eu nunca vi tanta pobreza, tanta miséria, na  Mabunda, na Samba, na Camuxiba, aquilo é um horror, as condições em que aquele povo vive e vivi com eles, nunca  me incomodavam, eu era um deles como outro qualquer, só tinha  uma cor diferente. Mas, à medida que eu desço para a cidade é um horror, racismo!

O racismo aqui não é mútuo, o racismo aqui é forte e é dos negros para os brancos. Mas, literalmente identificado, é de uma certa classe, são pessoas até privilegiadas. Muitas viajam, muitas vão daqui para a Europa, algumas portam-se mal no país de acolhimento e fazem-se de vítimas: “Nós afros”, nós afros, nada! “Nós afros” andam com roupas iguais às deles, porque não vão de bubus, porque é que se vestem de fato e casaco, então para ser africano basta ser preto? Não chega. Portanto, é um horror o que se passa aqui! Quanto mais distante do musseque aumenta e a medida que me aproximo do musseque esvanece, desaparecem todos os preconceitos, no centro há mais agressões (raciais).

Portanto, isto é um fenómeno que existe precisamente nas classes mais abastadas, vitimizam-se, vivem de associações racistas e pro racismo. Mas, só defendem determinada “cor” porque, se for um branco a fazer queixa que foi alvo de racismo, eles já não atendem, já não dão o tratamento que devem dar, isto em Portugal, factos comprovados.

Quando falamos de coisas da nossa sociedade e é este trabalho que estamos a fazer nesta recolha, também se trata disso, dos efeitos que causam em nós, são devastadores. Hoje temos uma extrema-direita a vencer em toda a Europa por causa dessas situações, as pessoas têm o seu cartão de cidadão da União Europeia e quando lhes interessa são europeus e quando não lhes interessa são africanos, quando tem uma quezília com a mesma cidadania, portugueses ou franceses, ou espanhóis por exemplo, já são africanos, já mostram o bilhete de identidade, porque é que não mostram o cartão de cidadão da União Europeia? Não fazem isso, manipulam. Presenciei agressividade lá e são precisamente os nossos compatriotas a fazerem os seus clãs, há não se integrarem, não respeitam a cultura deles, arrogantes. E claro que nós temos de ver as reações que causa em outros seres humanos e reagem. Hoje o que temos? Temos uma Europa extremamente agressiva, a extrema-direita a ganhar tudo, as represálias já estão aí: repatriamentos, expulsões de africanos, asiáticos, afro brasileiros e brasileiros, todos que causam perturbação no tecido cultural e social europeu, nós temos de respeitar quem nos acolhe porque se eu recebo alguém em casa ou vou a casa de alguém não posso abusar.

Este depoimento foi realizado na Sede da Rebita, Ilha de Luanda, no dia 28 de Março de 2024.

Palavras Chaves: Axiluanda| Rebita| Massemba|Kiezos| Concertina| Carnaval de Rua| Euclides Fontes Pereira| Malé Malemba| Dikanza| Grafite| Selos| Racismo|Luanda Cartoon|Massemba|Umbigada

Entrevistadores: D`Jassy Kissanga e Marinela Cerqueira

Edição: Marinela Cerqueira

Publicação: Sónia C.

Duração: 1:10

Audiovisual e Fotografia: Muki Produções


[1]A Bassula, Horácio Dá Mesquita, em Cultura | 23 de Julho a 5 de Agosto de 2012, pág. 15 O verão era o período propício para a aprendizagem desta “arte marcial” onde os pescadores eram preparados para determinados desafios que teriam de enfrentar na vida social e na defesa pessoal em caso de conflitos com os rivais ou vizinhos. A Bassula de Kissoco (amizade) era a verdadeira luta desportiva e recreativa, juntando-se familiares, amigos, pessoas de confiança e praticando-se em ocasiões reservadas.https://imgs.sapo.pt/jornalcultura/content/files/cultura_ix.pdf

[2]O Carnaval Angolano e a Construção da Identidade Nacional, Marco Hemingway de Almeida Rebita:  é um género de música e dança de salão angolana que demonstra a vaidade dos cavalheiros e o adorno das damas. Dançada em pares em coreografias coordenadas pelo chefe da roda, executam gestos de generosidades gesticulando a leve cidade das suas damas, marcando o compasso do passo da massemba. https://repositorio.unilab.edu.br/jspui/bitstream/123456789/186/3/Marco%20Hemingway%20de%20Almeida.pdf

[3] Cerca de 1570, Duarte Lopes escreveu, na sua “Relação do Reino do Congo e das Terras Circunvizinhas”, que o lugar chamava-se “Loanda, que quer dizer, naquela língua, terra rasa, sem montes e baixa”, levando a concluir que o local se chamaria assim por ser um areal raso. No entanto, estudos etimológicos da palavra levam a outra conclusão. Seguindo o princípio da derivação das línguas bantas, o prefixo lu é aplicado em palavras que descrevem regiões alagadas, como ilhas, braços e bacias de rios etc., seguido da estilização ortográfica das características topológicas dessa região. Dessa forma, surge a palavra luando, que, por se referir a uma ilha, um vocábulo feminino, ao ser aportuguesada deu o actual “Luanda”, vocábulo obtido através da aglutinação de lu + (nd)ando, onde ando é o étimo comprimido de ndandu, que significa “mercadorias“, “objecto de comércio”, “valores” etc., relativo aos produtos retirados da ilha, como o peixe ou os pequenos búzios (cauris) ali apanhados, normalmente conhecidos como njimbo ou zimbo e que eram a moeda corrente do Reino do Congo.[4] Segundo este estudo, a ilha teria o nome de Luando por ser um local de comércio situado num areal. Uma outra versão refere que o nome deriva de “axiluandas” (homens do mar), nome supostamente dado pelos portugueses aos habitantes da ilha, porque, quando ali chegaram e lhes perguntaram o que estavam a fazer, estes teriam respondido uwanda, um vocábulo que, em quimbundo, significa “trabalhar com redes de pesca”. Os habitantes originais da ilha são os axiluanda (Axilwanda), um subgrupo dos ambundos, em tempos súbditos do rei do Congo.[8] Os seus descendentes, os “pescadores da ilha”, guardam até hoje alguns hábitos tradicionais. https://pt.wikipedia.org/wiki/Ilha_de_Luanda

[4]O Prédio do Baleizão é um edifício histórico da cidade de Luanda, em Angola. Localiza-se no Largo da Amizade Angola-Cuba, anteriormente conhecido como Largo Infante D. Henrique e Largo do Baleizão. É um dos edifícios mais antigos de Luanda, tendo sido construído no século XVII, no início da colonização portuguesa de Angola. História A construção do edifício remonta ao século XVII.[1]Durante o período colonial, o edifício albergou o Colégio Dom João II,[2][3] vindo a ser classificado como Património Histórico Cultural, pelo decreto número 86, Boletim Oficial número 222 de 23 de Setembro daquele ano, em Luanda.[1]Em 1968, o colégio foi reaberto, partilhando então o edifício com o café Baleizão, onde se dizia serem feitos os melhores gelados de Luanda.[4]Nos anos 1970, o edifício começou a ser habitado por diversas famílias.[5]Em Janeiro de 2019, o edifício achava-se em avançado estado de degradação, sem água canalizada há dez anos e apresentando grandes fissuras, tendo ruído um dos apartamentos.[1][2] Em 7 de janeiro, as autoridades decretaram o seu encerramento, por falta de condições.[6] Todas as 24 famílias que aí habitavam foram desalojadas, sendo disponibilizadas três tendas no Bairro da Paz para o seu realojamento. Considerando a falta de condições do novo local, as famílias encontravam-se então habitando provisoriamente na via pública, no lado de fora do edifício.[1][6] Em Fevereiro do mesmo ano, dezasseis famílias haviam sido realojadas no Zango 4, no município de Viana.[7] https://pt.wikipedia.org/wiki/Pr%C3%A9dio_do_Baleiz%C3%A3o

[5]Cecília Gourgel esclarece que a primeira designação do género era Massemba. “Nos nossos documentos registamos com Massemba. Quem designou por Rebita, foram os portugueses ao chegarem a Angola. Eles viram que a Massemba assemelhava- se a uma dança francesa denominada “Rebit”, enquadrada no português como “Rebita”, como nós chamamos ”https://somosportugues.com/2019/04/30/angola-rebita-protegida-da-extincao-pelo-estatuto-patrimonio-cultural-imaterial-nacional/

[6] O Carnaval Angolano e a Construção da Identidade Nacional, Marco Hemingway de Almeida Rebita: Essas festividades foram repassadas de geração em geração em Angola como forma de testemunho de como era comemorado o carnaval no território nacional, os mais velhos contam que essa data comemorativa ao carnaval eram realizadas de várias formas, era comum ver lutas de carros ou charruas, ou seja, carros de tração animal e carros com carroças, também existia uma luta que até hoje é comum vermos, que é a lutas dos ovos onde todo mundo jogava ovos pra todo mundo, e havia aqueles mais ousados de faziam a mistura de farinha com água e ovo podre para jogar nos outros. Na era colonial já era comum o uso de máscaras, em alguns locais eram realizados concursos para eleger os melhores trajes carnavalescos da noite, e depois desses desafios eram feitas festas em casa de pessoas particulares, estas festas eram realizadas no período da manhã ou tarde, e ao anoitecer depois do jantar, havia a saída para rua com roupas disfarçadas e trajes carnavalescos que muitas vezes eram improvisados no momento com lençóis com buracos para facilitar a visão imitando um fantasma. Na altura com a falta de energia elétrica o disfarce metia medo a qualquer pessoa, eles em comemoração batiam nas portas das pessoas para assustar, era uma brincadeira em que as pessoas faziam com um único objetivo, que era o reconhecimento das pessoas com quem brincavam e de quem estava por trás da máscara ou do pano usado no momento da brincadeira. Mas com o passar dos anos foi se perdendo e o carnaval se modernizando. positorio.unilab.edu.br/jspui/bitstream/123456789/186/3/Marco%20Hemingway%20de%20Almeida.pdf

[7]OH, MUXIMA! A FORMAÇÃO DA MÚSICA POPULAR URBANA DE ANGOLA E O GRUPO “N’GOLA RITMOS” (1940-1950) DOI: 10.5935/2177-6644.2016002 Fontinhas nasceu em Luanda, no dia 2 de novembro de 1925 e cresceu numa família de músicos e artistas. Seu pai, José de Fontes Pereira, 20, também conhecido como “Abel Mwene o Dikota”, foi tocador de concertina e fundador do “Elite União Clube”, um grupo de Massemba da primeira metade do século XX. A irmã de Fontinhas, “Mamã Lala”, foi a primeira rainha de Carnaval do grupo “Cidrália”; seus tios por parte de pai, Luís de Fontes Pereira e António de Fontes Pereira compuseram várias canções e entre elas “Ó massangu ngi madiami” e “Diá Ngó”. Outra figura muito importante a lembrar é a de seu irmão, José Oliveira de Fontes Pereira, também chamado de “Malé Malamba”. Ele foi compositor, bailarino, coreógrafo e o fundador da primeira escola de semba em Angola, no final dos anos 1950. José de Oliveira Fontes Pereira, assim como seu irmão, Fontinhas, era um grande defensor do uso da dikanza. file: ///Users/jmvc/Downloads/ojs,+09+-+Amanda+Palomo+Alves.pdf

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